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Por que maratonistas esquecem as dores que sentem na prova?

 

Chegar ao fim de uma maratona é uma sensação ao mesmo tempo maravilhosa e uma tremenda agonia. Cãibras nas coxas, dores nas costas, dedos em carne viva e estômago revirado. Um tempo depois os músculos das pernas ficam tão doloridos e enrijecidos que os corredores precisam de ajuda pra descer escadas e até pra se levantar do banheiro.

Apesar dessa situação dolorosa e da vergonha, muitas pessoas que conseguem terminar uma maratona não veem a hora de competir novamente, para o espanto dos amigos e dos entes queridos que testemunharam o momento em que tiramos as meias sangrentas ao final da primeira corrida.

Um novo estudo psicológico tenta explicar porque as pessoas fazem isso e revela que alguns maratonistas parecem ter desenvolvido uma espécie de amnésia seletiva, esquecendo-se com o passar do tempo o quanto a experiência doeu. Contudo, essa amnésia parece depender do quanto o atleta gostou de correr a maratona.

A maioria das pessoas tem consciência de que a dor é uma experiência subjetiva até certo ponto. Por outro lado, é óbvio que quando você se corta ou bate os pés contra o asfalto por 42 quilômetros, a sensação de desconforto é perfeitamente objetiva.

Contudo, a psicologia indica que os sentimentos no momento em que alguém se machuca ou sente dor – ou seja, o contexto emocional da dor – podem alterar drasticamente a sensação da dor. De forma geral, a dor ligada a uma experiência positiva é percebida como uma sensação menos excruciante assim que deixa de ser sentida.

Da mesma forma, nossa memória da dor depende do contexto emocional. Em um estudo publicado este ano, pesquisadores poloneses entrevistaram mulheres que haviam passado por algum tipo de cirurgia ginecológica ou que haviam acabado de dar à luz e pediram para que elas avaliassem a dor naquele momento. Todas relataram níveis altos de dor.

Entretanto, quando entrevistadas meses mais tarde sobre a dor que sentiram, as mulheres que haviam sido submetidas à cirurgia superestimaram a quantidade e a intensidade da dor que sentiram após a operação, ao passo que as mulheres que haviam dado à luz subestimaram a dor que haviam sentido, especialmente se tivessem passado por parto normal. (Mulheres submetidas à cesariana tinham, de forma geral, memórias mais precisas.)

Nossas memórias da dor são "influenciadas pelo significado" da dor, concluíram os autores do estudo. Cirurgias raramente são ocasiões felizes e, portanto, levam as mulheres a lembrar da dor com mais intensidade, ao passo que o nascimento de um filho, quase sempre um momento de alegria, leva as mães a se esquecerem convenientemente das dores causadas pelo parto.

Todavia, ainda não existiam pesquisas específicas para determinar se as dores causadas pela prática esportiva também são recordadas com imprecisão, ou se essas variações exageram a lembrança da dor para mais ou para menos. Uma pesquisa dessa objetiva com emoções subjetivas.

O método do estudo foi bastante simples. Na linha de chegada da Maratona da Cracóvia de 2012, o pesquisador pediu para que 64 corredores numerassem a intensidade da dor e o desconforto sentido naquele momento, além de uma definição de seu estado emocional.

Os maratonistas geralmente relataram dores e desconfortos moderados no momento, chegando a uma média de 5,5 em uma escala de zero a 10.

Então, após três ou seis meses, os mesmos maratonistas tinham de se lembrar da dor que sentiram após a corrida.

Suas memórias eram consideravelmente diferentes da sensação de dor imediata. A maioria dos maratonistas, tanto o grupo questionado depois de três meses, quanto o grupo questionado após seis meses, se lembrava de uma maratona muito menos dolorosa do que nos instantes que se seguiram ao fim da corrida.

Na verdade, a maior parte dos entrevistados afirmou que o nível de dor e desconforto não passava de 3, na escada de zero a 10.

Porém, os maratonistas que relataram um nível de felicidade mais baixo ao final da corrida geralmente se lembravam da dor com mais precisão, quando comparados aos atletas que sentiram mais prazer ao final da maratona, mesmo que a dor relatada por ambos os grupos fosse similar ao final da corrida.

Naturalmente, o estudo foi curto e limitado, envolvendo apenas maratonistas e sem controle por idade, situação física, personalidade e outros fatores.

Contudo, as descobertas "ajudam a explicar porque as pessoas sempre voltam a correr maratonas apesar das dores causadas por esse tipo de experiência física", afirmou Babel.

A amnésia seletiva associada às maratonas pode ter uma base evolutiva, acrescentou, já que os primeiros humanos costumavam correr para sobreviver e talvez precisassem ignorar parte da dor e do desconforto.

Porém, o estudo também sugere que quando a experiência não é divertida, a impressão da dor pode aumentar drasticamente, o que está longe de ser motivador. Isso significa que você precisa encontrar uma atividade da qual goste muito, caso queira manter uma rotina pesada ou um programa de treinamento competitivo, além de se esquecer das dores causadas pela prática.

The New York Times



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